quarta-feira, 29 de agosto de 2012

O "Folclore" é a arte de ensinar os saberes populares...

O folclorista Americano do Brasil
Bariani Ortencio - O Popular - 15/8/1993

     No ano passado comemorou-se o centenário de nascimento e também os 60 anos do assassinato de Antônio Americano do Brasil. Há 30 anos ele é o meu patrono na Academia Goiana de Letras. Silvânia e Luziânia, a primeira, cidade de seu nascimento, e a segunda, onde clinicou e morreu covardemente assassinado, em 1932. Como deputado nacional foi o grande vitorioso da mudança da Capital Federal para o Planalto Central, embora se realizando 28 anos depois da sua morte. Político a ser imitado, tendo como plataforma de trabalho parlamentar, o amor pela pátria, a responsabilidade em representar o povo goiano, e a honestidade, o respeito pelas coisas públicas.
   O médico, parlamentar e escritor não foi o precursor do Folclore em Goiás, aliás, na região do Brasil Central, mas o que mais pesquisas realizou e escreveu utilizando o Folclore em seus livros. Americano, estudioso e produtor literário profícuo, seguiu as trilhas dos trabalhos dos seus antecessores, conseguindo riquíssimo material folclórico, constante do seu livro Cancioneiro de Trovas do Brasil Central. Estudou as transformações que sofreram os hábitos e costumes, a poesia e as danças populares, que se processaram e ainda continuam se processando as transformações das suas origens para o Brasil Central.    
    Impressionado com uma conferência que assistiu, pronunciada pelo eminente antropólogo João Ribeiro, Americano do Brasil se propôs a registrar, no sertão de sua terra natal, todas as manifestações folclóricas do seu povo, representadas principalmente, pela poesia e pelas danças populares. Assim fez e ninguém melhor do que ele poderia ter feito. Estudou e anotou, com ouvidos atentos, olhos abertos e de lápis em punho, o que de mais rico e interessante encontrou, mais notadamente, entre vales do Paranaíba, do Corumbá e do Paranã, onde deduziu que aí, nestas regiões, estava o habitat mais fecundo do Folclore goiano. Descobriu, também, que o manancial da poesia popular de Goiás é dos mais vastos e atraentes, quando comparados com o de outras regiões brasileiras. O interessante e valoroso na sua obra, como disse, foi mostrar as origens e as transformações sofridas nas adaptações dos gêneros de poesias e danças para a literatura do povo, nas regiões por onde pesquisou. Assim, da monda e da sacha, veio o mutirão do Brasil Central, com as suas cantigas; a décima veio da xácara, porém, com mais naturalidade; o fado português transformou-se na genuína moda sertaneja, embora com grande diferença da modinha aristocrática; o batuque angolano foi se transformando e deu o recorte ou recortado, também o lundu e o coco; da quadrilha francesa surgiu o saruê (soirée); a curraleira foi vinda dos lanceiros que cantavam nos salões imperiais; a catira é a transformação do cateretê dos índios brasileiros, sendo a dança mais executada nos pousos-de-folias, no eixo norte de São Paulo, Triângulo Mineiro e sul de Goiás.
     É interessante notar que tais transformações foram aceitas porque tudo evolui e se molda à época e às regiões. Mas a música sertaneja, atual, com as suas duplas, que está aí preenchendo todos os espaços, e faturando alto, quer na zona rural, quer nas cidades, persiste ainda em ser sertaneja, não aceitando a transformação para música popular, pois se ela é absolvida totalmente pelo povo, então, é e deve ser popular, porque a sua temática não é sertaneja, assim como os ritmos, e as vestimentas dos componentes das duplas, também a instrumentação, nada disso é sertanejo. Portanto, é música romântica popular cantada em duplas.
    Americano do Brasil estudou estas transformações em 1922, portanto, há 70 anos, e tais transformações já existiam antes. Tudo o que pesquisou, explica e dá exemplos. Assim, no seu Cancioneiro de Trovas do Brasil Central, o leitor interessado no estudo do Folclore, vai encontrar rico manancial de poesia popular, danças e folguedos, como os desafios (que vão pela noite adentro), os recortados, as nodas, os bailes, as décimas, os infindáveis ABCs (que foram como os jornais do sertão, relatando os acontecimentos). As danças populares enriqueceram o nosso sertão e hoje estão em extinção. Seria interessante, e mais que oportuno, que as escolas do 1º grau, aqui em Goiás, dando exemplo a outros Estados, ensaiassem as principais, pois ainda há pessoas que se recordam bem delas, basta pesquisar (Alberto da Paz, o Ás de Ouro, rei cristão das cavalhadas de Santa Cruz, sabe quase todas). Estamos trabalhando para que o Folclore entre para o currículo escolar, pois ele é tão importante nesta fase de escolaridade, como é o Português e a Matemática. Macktub!

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